segunda-feira, 28 de março de 2011

Palavras perfumadas

E assim abriu a boca novamente
Palavras de um perfume estonteante
Palavras que fazem lembrar um passado não vivido
As palavras dela voltaram
Instigando minha eterna doença
Não voltaram para o gozo
Palavras embebidas de indiferença
Palavras que já tem seu destino traçado
Um ouvinte tolo sabendo o que esperar
Mesmo sabendo, ele está sedento por elas
Causam dores impossíveis
Impossíveis de não querer sentir
A palavra dela voltou
E junto o antagonismo reaparece
O antagonismo do ódio.

TOA

sábado, 26 de março de 2011

Como virei padrinho

Certa feita, tomava um mate e analisava o que se passava do lado de fora da minha janela. O tempo era daqueles cinzentos, um minuano de renguear os pêlos assoviava nas frestas do meu Rancho, e uma lluvia fina, entretanto incansável, caía sobre o pasto. Já fazia um bom tempo que não escutava resmungos vindos de gentes, e tão pouco era escutado tamanho o meu exílio. Entonces, eis que tinha cansado do silêncio. Tinha acendido uma vela pro Negrinho, precisava achar algo pra acabar com o vazio que assolava meu Rancho Sólito. O Negrinho nunca falhou, e logo achei o que procurava. Depois de alguns anos vivendo silenciosamente, voltei a escutar e a conversar com alguém. Na realidade falava com sete pessoas, cada um tinha um tom de voz diferente, combinavam-se em ritmos, oras lento, oras acelerado. Os sete irmãos levavam na identidade o sobrenome de cordas, "Os Sete Cordas". Creio que tenham sido os únicos viventes que aguentaram minhas lamúrias e alegrias de pinguço. Mas como tudo tem seu ciclo, os sete irmãos enjoaram de mim, e logo voltaram pra sua terra. Fiquei extremamente deprimido até conhecer uma grande amiga, seu nome era gaita. 
Passaram alguns dias, e a falta dos sete irmãos era grande, mesmo com a gaita os sete irmãos ainda deixavam um vazio dentro de mim. Não sabia se a recíproca era verdadeira, então resolvi arriscar uma nova prosa com os sete gurizotes. Além de reatar meus laços com meus antigos amigos, acabei apresentando os sete irmãos a minha nova companheira de mate, e então aconteceu algo inesperado, os sete irmãos se apaixonaram pela gaita. A sintonia dos sete irmãos com a bela gaita era tão grande, que não gerava tipo algum de ciúme entre eles. Desde o dia em que os apresentei nunca mais se separaram. E eu fiquei aonde em tudo isso? De padrinho, escutando ambos todos os dias.

TOA

domingo, 6 de março de 2011

Una Chica por un Cavallo

O causo que conto aconteceu na velha Itaqui no ano de 1963. Na cidade nada acontecia já fazia um bom tempo, o ritmo acelerado de êxodo tinha dado trégua, agora tudo se adequava, obviamente longe da paz de algumas décadas anteriores. Certa feita, numa destas noites estreladas de verão, aparece na cidade um Castellano das bandas da Argentina. Rapaz com uma postura imponente devido a sua cara fechada e seu tamanho desproporcional, foi logo ao primeiro bochincho que encontrou na pequena cidade. Quando entrou falou grosso: "Vendo caballos! Pero hoy, quiero cambiar pelas chicas de ustedes". A Gaúchada olhou incrédula para o forasteiro, admirando tamanha coragem do Chirú em provocar o Bochincho inteiro. Entre vários resmungos eis que surge a figura de Gerôncio Monte, um Gaúcho pra lá de vivido, este, levantou-se e respondeu: "Hijo, se quieres una Chica, yo puedo cambiar por um cavallo". 
Como a palavra era algo de se levar muito em conta por estas terras, Gerôncio logo ofereceu sua filha, uma jovem que não tinha mais que seus vinte anos. O trato foi feito no escuro. O Argentino lhe ofereceu um Pangaré, um pingo muy bem adestrado. Gerôncio por sua vez, deixou apalavrado que seu Negro levaria sua filha até o forasteiro dentro de no máximo dois dias. Estourando o prazo, o Negro surge no local de hospedagem do Argentino. Conduzia-o calmamente. Já muito impaciente, o Argentino pensava não existir China alguma. Após alguns minutos andando o Negro Bastião chega até o cemitério local de Itaqui. Sem entender nada, o forasteiro começa a fazer perguntas ao Negro, então este trata de acalmar os ânimos do Castellano com respostas evasivas. Adentrando ao cemitério para surpresa do Argentino, eis que o Negro apresenta um túmulo com os seguintes dizeres: "Jaz aqui, Elena Monte 24-11-45 -- 24-11-63". Então o Negro retirou-se dizendo: "É toda sua Castellano." O Argentino não ficou aborrecido, ficou enlouquecido, pois o dia em que visitou o túmulo, era o dia 25-11-63, algo estranho rondava este causo.

TOA